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23 de Abril de 2024

Remissão do IPTU e o Covid-19

É possível remissão geral (perdão) doIPTU de 2020 em razão da pandemia do Covid-19?

Publicado por Gabriela Fernandino
há 4 anos

É possível remissão geral (perdão) do IPTU de 2020 em razão da pandemia do Covid-19?

Esta é uma pergunta que tem sido feita por diversos alunos da Pauta Municipal. E a resposta é: Depende.

De acordo com o Artigo 172 do CTN, a lei pode autorizar a autoridade administrativa a conceder, por despacho fundamentado, remissão total ou parcial do crédito tributário, atendendo:

I - à situação econômica do sujeito passivo;

II - ao erro ou ignorância escusáveis do sujeito passivo quanto à matéria de fato;

III - à diminuta importância do crédito tributário;

IV - a considerações de equidade, em relação com as características pessoais ou materiais do caso;

V - a condições peculiares a determinada região do território da entidade tributante.

Podemos, portanto, estar diante do caso de “condições peculiares a determinada região do território da entidade tributante, ou mesmo “a considerações de equidade, em relação com as características pessoais ou materiais do caso”.

No entanto, o tema merece um estudo muito mais profundo. A Constituição Federal de 1988 em seus artigos 70 e 165, § 6º, estabelece o controle sobre as renúncias de receita, com o nítido objetivo de promover o equilíbrio financeiro da união, estados e municípios.

Já a Lei de Responsabilidade Fiscal, Lei Complementar 101, estabelece, no Art. 11 a necessidade de instituição, previsão e efetiva arrecadação de todos os tributos de competência constitucional dos entes da Federação, como requisito essencial da responsabilidade na gestão fiscal.

Além disso, em seu § 1º do Art. 14, a Lei de Responsabilidade Fiscal estabelece textualmente que a remissão, por si, é renúncia de receita e sua concessão deverá estar acompanhada de estimativa do impacto orçamentário financeiro no exercício em que deva iniciar sua vigência e nos dois seguintes, atender ao disposto na lei de diretrizes orçamentárias e a pelo menos uma das seguintes condições:

I - demonstração pelo proponente de que a renúncia foi considerada na estimativa de receita da lei orçamentária, na forma do art. 12, e de que não afetará as metas de resultados fiscais previstas no anexo próprio da lei de diretrizes orçamentárias ou II - estar acompanhada de medidas de compensação, no período mencionado no caput, por meio do aumento de receita, proveniente da elevação de alíquotas, ampliação da base de cálculo, majoração ou criação de tributo ou contribuição.

A priori não é possível, portanto, a remissão do IPTU do ano de 2020, ainda mais em caráter geral, pois é impossível atender a um dos dois incisos do Art. 14. Estamos falando de perdoar a dívida relativa à totalidade de uma receita própria importante do Município, que, como sabemos, iria para o Caixa Geral para subsidiar todos os programas do Município, inclusive os de saúde.

Por outro lado, no último dia 29 de março de 2020, o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), deferiu medida cautelar que afasta a exigência de demonstração de adequação orçamentária em relação à criação e expansão de programas públicos destinados ao enfrentamento do Covid-19.

O Ministro ponderou que, em outra oportunidade, “como relator da ADI 2238/DF, ao votar pela constitucionalidade do artigo 14, inciso II, da LRF”, afirmou “que, o art. 14 da LRF se propõe a organizar uma estratégia, dentro do processo legislativo, para que os impactos fiscais de um projeto de concessão de benefícios tributários sejam melhor quantificados, avaliados e assimilados em termos orçamentários.”

Mas também asseverou o Ministro que: “Há, porém, situações onde o surgimento de condições supervenientes absolutamente imprevisíveis afetam radicalmente a possibilidade de execução do orçamento planejado, tendo a própria LRF, em seu artigo 65, estabelecido um regime emergencial para os casos de reconhecimento de calamidade pública, onde haverá a dispensa da recondução de limite da dívida, bem como o cumprimento da meta fiscal; evitando-se, dessa maneira, o contingenciamento de recursos; além do afastamento de eventuais sanções pelo descumprimento de limite de gastos com pessoal do funcionalismo público.”

E a pandemia do corona vírus é um destes casos gravíssimos e supervenientes, inclusive ocorrido já durante a execução orçamentária do ano de 2020. No entanto, muitos Municípios ainda não lançaram o IPTU, muito embora já tenha ocorrido o fato gerador.

A grande questão hoje enfrentada por estes Municípios é conseguir elaborar medidas de enfrentamento também dos impactos que o combate à pandeia tem causado na economia familiar e das próprias empresas, muitas delas proibidas inclusive de funcionar.

Também sobre isso recai a preocupação do STF quando da concessão da Cautelar. Senão vejamos trecho importante da decisão:

“O surgimento da pandemia de COVID-19 representa uma condição superveniente absolutamente imprevisível e de consequências gravíssimas, que, afetará, drasticamente, a execução orçamentária anteriormente planejada, exigindo atuação urgente, duradoura e coordenada de todos as autoridades federais, estaduais e municipais em defesa da vida, da saúde e da própria subsistência econômica de grande parcela da sociedade brasileira, tornando, por óbvio, logica e juridicamente impossível o cumprimento de determinados requisitos legais compatíveis com momentos de normalidade. O excepcional afastamento da incidência dos artigos 14, 16, 17 e 24 da LRF e 114, caput, in fine, e § 14, da LDO/2020, durante o estado de calamidade pública e para fins exclusivos de combate integral da pandemia de COVID-19, não conflita com a prudência fiscal e o equilíbrio orçamentário intertemporal consagrados pela LRF, pois não serão realizados gastos orçamentários baseados em propostas legislativas indefinidas, caracterizadas pelo oportunismo político, inconsequência, desaviso ou improviso nas Finanças Públicas; mas sim, gastos orçamentários destinados à proteção da vida, saúde e da própria subsistência dos brasileiros afetados por essa gravíssima situação; direitos fundamentais consagrados constitucionalmente e merecedores de efetiva e concreta proteção.

.....

A pandemia de COVID-19 (Coronavírus) é uma ameaça real e iminente, que irá extenuar a capacidade operacional do sistema público de saúde, com consequências desastrosas para a população, caso não sejam adotadas medidas de efeito imediato, inclusive no tocante a garantia de subsistência, empregabilidade e manutenção sustentável das empresas.

A temporariedade da não incidência dos artigos 14, 16, 17 e 24 da LRF e 114, caput, in fine, e § 14, da LDO/2020 durante a manutenção do estado de calamidade pública; a proporcionalidade da medida que se aplicará, exclusivamente, para o combate aos efeitos da pandemia do COVID-19 e a finalidade maior de proteção à vida, à saúde e a subsistência de todos os brasileiros, com medidas sócio econômicas protetivas aos empregados e empregadores estão em absoluta consonância com o princípio da razoabilidade, pois, observadas as necessárias justiça e adequação entre o pedido e o interesse público.”

Assim, com base nos argumentos expostos pelo próprio Ministro, é perfeitamente possível entender que a remissão geral do IPTU do ano de 2020 é possível, pois se referem aos gastos governamentais indiretos decorrentes do sistema tributário, que visariam atender objetivos econômicos e sociais a um grupo de contribuintes, produzindo a redução da arrecadação potencial e aumentando a disponibilidade econômica do próprio contribuinte. É, portanto, uma maneira de garantir que aquele valor relativo ao IPTU não saia das mãos do contribuinte para que agregue à sua renda de subsistência neste período de crise.

Mas, em administração pública, como é cediço, toda ação deve ser fundamentada. Há de haver fundamentação plausível que consubstancie a importância da não cobrança, mesmo sendo este um recurso determinante para a manutenção das políticas públicas.

Ao afastar a exigência de demonstração de adequação e compensação orçamentárias em relação à criação/expansão de programas públicos destinados ao enfrentamento do contexto de calamidade gerado pela disseminação de COVID-19, o STF não afastou a necessária fundamentação deste ato.

Superada a questão orçamentária, temos ainda que enfrentar as condições materiais para que seja possível a remissão do IPTU:

1 – A MEDIDA CAUTELAR só é válida para o ente da federação que tenha decretado estado de calamidade pública decorrente da pandemia de COVID-19.

2 – Para haver a remissão deve haver lei complementar para tal.

3 – E, a remissão só pode alcançar os tributos já lançados.

Estamos diante de questões de cunho jurídico importantes. Temos o objetivo de, por meio de remissão de IPTU, garantir que a população não abra mão de recursos que poderão ser importantes para sua subsistência (inclusive para pessoas jurídicas), mas recursos estes que também são importantes, a título de recursos próprios para a própria manutenção do sistema de saúde, caso o IPTU seja cobrado.

Importante destacar que a remissão deve ser, neste momento, um instituto amplamente discutido com a equipe do Município, mesmo porque a área contábil deve estar completamente alinhada com as decisões.

A Pauta Municipal, apesar de ver a possibilidade da remissão do IPTU de 2020, entende que a distribuição de recursos de uma forma coordenada para a população necessitada pode surtir mais efeitos, já que a justificativa de um projeto deste vulto depende das mais diversas variantes.

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